Desmanche

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Desmanche, de Silvio Pedro, é o segundo livro de um poeta hábil. O seu primeiro, Inventário afetivo (2012), já apresentava uma rara consciência formal para um trabalho de estreia e elaborava certa perplexidade da condição ambígua da lírica e do trabalho estético na realidade atual. Os poemas respondiam a essa condição muitas vezes de maneira delicada, embora essa delicadeza se desse entre ruínas, despojos, ou em uma chave de incômodo existencial, social, o que trazia gravidade, peso, às composições. Desmanche parece inverter essa direção de construção, a gravidade dá o ritmo da queda e o que é “leve” é o pó que sobra flutuando nesses espaços vazios e/ou ruinosos cegando o leitor.

Já no incrível poema de abertura, Lápide, esse ar opaco, que começa a se levantar desse escombro, aparece ao final depois de um bonito rebatimento de ausências por meio da ação de uma personagem feminina desta maneira: quando de noite / [ela] abateu num sopro//o pó do meu nome. E daí continua entre as rachaduras, os vãos de paredes, os ocos, as ausências, ou entre brechas em que: não há deus (…) só a morte / sujando nossa cara / com medo antigo.

Entre esse cenário, ou nesse escombro, vozes que só se entreviam em seu primeiro livro se levantam às vezes com sarcasmo, às vezes com ironia, exaustas de todo um esforço que parece sem sentido ou, ainda, em toda uma gama de modulações. Essas novas variações, que acontecem com um novo volume de voz, e a mudança de direção nas composições de Silvio Pedro cifram uma brutal distância entre dois tempos recentes e o espaço possível para poesia neles, um aparentemente mais leve e delicado, do seu Inventário afetivo de 2012, e esse do seu (e do nosso) Desmanche de 2019.

Em outras palavras, este livro, leitor, que você tem em mãos possui a difícil e rara medida do que nos resta:

¿qual o modo correto

de levantar paredes

 

Carlos Pires

 

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